148 | um vislumbre de algo poderoso

mari
3 min readFeb 2, 2023

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Lá pelos meus quinze anos uma amiga dizia conseguir ler o meu humor do dia pelo estado dos meus cabelos. Já faz tempo que não tenho quinze anos, já faz tempo que não a encontro e mais tempo ainda que ela não lê os meus cabelos, mas toda vez que eu me sinto murchar enquanto ele desbota e acender quando faço alguma mudança brusca me lembro daquele dia no ônibus de excursão da escola em que eu sentei ao lado dela sem falar nada, ela me olhou atentamente e falou "tá com muito frizz, que que foi?" enquanto assumia a postura de ouvinte de desabafo. E eu desabafei. Ela sabia. Foi o frizz.

O último ano passei por vários tons de roxos e azuis e pela primeira vez platinado — cores passivas, introspectivas. Durante o último ano também passei o tempo todo com o mesmo corte de cabelo, o que na minha vida é um feito extraordinariamente raro, especialmente considerando que sou eu mesma que o corto e que posso meter a louca a qualquer momento, o que eu sempre fiz, mas não dessa vez. Dessa vez foi diferente porque quando eu cortei esse corte pela primeira vez mais de um ano atrás eu sorri um sorriso de rosto inteiro e admirei minha obra de arte por alguns minutos em silêncio, seguidos de uma tagarelice exaltada sobre como eu ACHEI! EU ACHEI! Eu não sabia que eu tava procurando, mas eu achei o meu corte! Olha pra mim! Olha isso! Diz se não sou eu.

Ainda não cansei do corte, mas cansei das cores passivas. Chega! Pois espremi o rosa choque na tigela, enfiei os dedos na meleca e esfreguei pelo cabelo todo. Ufa… Sempre falo isso, mas é porque toda vez eu me maravilho de novo com o quão certeiro é o fato de que logo depois de eu mudar o cabelo eu tenho um surto criativo. Toda. Vez. É incrível. Até que pouco a pouco ele vai desbotando e perdendo o corte e por mais que ele continue bonito não é bonito que eu quero, é diferente.

Não deu outra. Com o cabelo rosa-choque fui convocada mais uma vez aos meus rotineiros serviços de cabelereira de todo mundo que habita o meu círculo próximo e o que era pra ser um corte se tornou O CORTE! Concentrada na minha missão comecei aos poucos e pouco a pouco senti a inspiração inflando meu ser de tanta vida que nem consegui conter os sorrisos que brotavam no meu rosto.

Posso? Perguntei quando percebi que o que eu queria fazer e na verdade já tinha começado ia contra o que foi pedido que eu fizesse. Com certeza! As pessoas tendem a ser exigentes com seus cabelos — e eu entendo demais — então esse nível de liberdade criativa acabo tendo só comigo mesma, mas essa cabeça em especial já passou por revoluções estéticas demais na minha mão e sabe que o melhor a fazer quando eu começo a empolgar é relaxar e deixar com que eu faça a minha mágica.

E eu fiz minha mágica. E ficou lindo. E foi lindo. E foi também um marco importante em um dia importante durante uma transição importante. E eu me senti incrível. Eu me senti um absurdo de incrível. No espelho me vi feliz como em poucas vezes me vi feliz assim no espelho e me senti tão cheia de mim que não parei de transbordar em sorrisos.

30 de janeiro de 2023

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