Dita com rancor e recebida com carinho a interrogação ainda ressoa em meus ouvidos.
Acho que estive me dobrando, tentando entender até onde consigo chegar sem quebrar e descobri que diferente dos meus quadris até que sou bem flexível quando me disponho a ser, talvez até demais. Algumas lascas se perderam, infelizmente, ressequei e criei estrias de tanto espichar, mas dobrei até engolir meu próprio rabo, virei círculo, voltei pro mesmo lugar.
Entendi…
Tem razão.
Concordei enquanto te ouvia e continuo a concordar, só que complemento.
Me dôo demais, eu sei, aprendi que é isso que se faz pra garantir amor. É preciso se negar até que a face desapareça do rosto e a voz é quem denuncia o que a boca não deixa passar, indomável ela e é por isso que se cala.
Padrões reproduzidos e reproduzidos e reproduzidos até que a gente diga chega. Tem toda a razão, concordo, ainda assim não consigo deixar de sentir.
E o que sinto às vezes é que o mundo se esfarela em minhas mãos e minhas mãos se esfarelam no mundo e tudo deixa de ser, deixamos de ser, deixo eu de ser, morri, fim, acabei.
O ruim de viver desse jeito é que a cada dia me vejo morrer, uma de mim no mínimo. Num dia bom, várias eus nascem e morrem e nascem e morrem e nascem. E morrem. Vez ou outra visito o cemitério, deixo flores e choro por suas perdas enquanto celebro o que vem lá. Vez ou outra sinto o fim do mundo me sacudir, se tiver sorte ele me chacoalha tanto que me encaixa de volta no lugar.
O abismo me assusta, mas se eu não quisesse pular eu eu não ficaria o tempo todo tão perto da borda.
31 de março de 2023