233 | carne viva só pode ser crua

mari
2 min readApr 27, 2023

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A lua em câncer tem um jeitinho especial de me virar do avesso, todo mês sei exatamente quando ela chega pelo estado de completa merda que se apossa do meu corpo. Espinhenta tudo dói, tudo incomoda, tudo sensibiliza. A lua tá em câncer, mari, tô preparado pra todos os fluxos emocionais que vão vir, pode botar pra fora. Até você já sabe, já aprendeu por um acúmulo de experiências nesses meses que a gente se conhece que realmente acontece um negócio diferenciado nos dois dias que ela move as águas cancerianas. Também você sente, né, ela também te pega de jeito até porque, afinal, foram nossas cabritas velhas que se afinizaram em primeiro lugar.

É incrível o tanto de vulnerabilidade que pode transbordar quando a gente permite que ela escorra, que se exponha e que se sofra porque nunca é gostoso deixar órgãos que foram feitos pra ficarem pro lado de dentro pendurados ao relento. É sim um monte de outras coisas boas, mas não gostoso, não na hora pelo menos. É a transmutação extraordinariamente desconfortável.

Também precisa ser no lugar certo. Precisa ser seguro porque não tem como tirar a armadura onde existe risco e aprender onde ficam esses lugares não é fácil especialmente quando a gente não viu nada disso na infância. Às vezes a gente se engana e se abre onde não devia, toma golpe, leva soco, leva facada, leva cuspe na cara ou também não leva nada. Mas as vezes a gente acerta e encontra aqueles lugarzinhos especiais naquelas pessoas especiais que vão olhar com carinho pras nossas repugnâncias, que vão acolher nossos demônios e tocar com delicadeza nas nossas fragilidades.

É na segurança que me deparo com quanto tempo convivi com a falta dela e no conforto choro por todas as vezes que não consegui me proteger. Confiança é uma coisa difícil de encontrar e pensando nisso me lembro de atravessar a rua movimentada à passos rápidos de olhos fechados apenas segurando no seu braço.

25 de abril de 2023

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