nada faz sentido, mesmo quando faz

mari
3 min readJul 30, 2022

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Estudo, leio, escuto, observo, processo, entendo. Pelo menos acho que entendo, ao que tudo indica sim, parece fazer sentido. Digo sempre que todas as respostas estão dentro, mas sei que essas respostas não vou encontrar dentro de mim, ou melhor, vou sim, mas só se primeiro eu me colocar pra fora. Parece estranho e eu sei que é, mas nem sempre sinto. Sinto várias coisas e até mesmo muitas que eu não faço a menor ideia do que são, mas estranho acho que não. Estranho é pensamento, não sentimento. O que sinto é desconforto, como uma etiqueta pinicando atrás do pescoço ou aquela dorzinha na lombar de ficar deitada de qualquer jeito o dia todo na cama, mesmo que esteja extremamente confortável, talvez inclusive seja pior por isso. Às vezes vivo a vida e esqueço, mas uma hora me mexo e o cantinho sem-vergonha da etiqueta volta pro milímetro de pele que já não aguenta mais. Estranho. Não gosto de me sentir incoerente e é isso que tem pra hoje. Não errada. Não certa. Incoerente. Estranho.

As rachaduras na armadura deixam o ar fresco entrar e ele rodopia por entre meus joelhos fazendo cócegas. Me sinto ótima e logo depois ridiculamente idiota. Parece errado soltar a mão do corrimão ao mesmo tempo que parece ser a única coisa que faz sentido no mundo. Onde coloca a mão que não segura em nada? No bolso? Pra cima? Deixa… Solta???? Não pode ser. Não faz sentido. Mão precisa fazer alguma coisa senão a cabeça despenca. Se a cabeça despenca o coração não sabe o que fazer e congela num sono criogênico sem data pra acordar. Se o coração dorme ninguém bombeia água pros olhos e eles ressecam e morrem fixos no espaço vazio entre ver e enxergar. Pronto. Agora não se faz mais nada e tudo por causa de uma mão boba que ousou se soltar do corrimão enferrujado que não leva a lugar algum.

Não sei o que sinto. Não sei o que penso. Mas tem horas que sei exatamente o que sinto e sei exatamente o penso e tudo faz sentido finalmente, nem acredito! Fico tão incrédula que não percebo a clareza lentamente se apagando até que eu esteja quase que completamente no escuro de novo. Dia e noite, né? É o ciclo natural das coisas, no final das contas. É a montanha-russa premiada pela intensidade dos picos de adrenalina que causa nos corpos que por livre e espontânea vontade escolheram se sentar ali. Até pagaram ingresso. Eu, pessoalmente, tenho plano de assinatura. Oscilo entre sentir absolutamente tudo e não sentir nada e a verdade é que esse me parece ser o melhor jeito de eu viver. O único, eu diria.

A verdade é que eu entendo, eu juro que eu entendo. Eu entendo cada dia mais. Outra verdade é que também o que eu sinto nem sempre faz sentido e nem eu também me entendo. Pensamento e sentimento, né, nem sempre se alinham perfeitamente. Mais uma verdade é que a cada dia que passa eu abro um pouco mais mão de entender. Nem tudo precisa fazer sentido, eu claramente não faço sentido e o mundo, convenhamos, muito menos. Aos poucos entendo que sentido não se faz e sim se encontra entre os dedos e a pele num carinho que só pode existir se primeiro eu soltar esse inferno desse corrimão.

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